Quando Aline se tornou mãe, uma pergunta começou a ecoar na sua mente: “Que exemplo estou dando para meu filho?”
Ela sabia que não queria um filho preso a telas, percebendo que era preciso ser o próprio exemplo para romper ciclos antes que eles sejam herdados pela próxima geração.

Questionando o excesso de tempo no Instagram, a ansiedade crescente e a ilusão do feed infinito, Aline decidiu mudar. Nesta entrevista, ela conta como foi abandonar seu perfil pessoal nas redes sociais e reencontrar presença, coerência e paz no mundo real.
Por que você decidiu ter uma rede social?
Bom, como boa millennial, sinto que minha vida é misturada com a internet. Ela ajudou a moldar minha personalidade desde o começo. Nós, millennials, não somos nativos digitais, mas crescemos e aprendemos junto com a tecnologia, que foi se desenvolvendo muito rápido.
Desde o ICQ e MSN, eu já tinha conta. Depois veio o Orkut, fotolog, Flogão e sempre acompanhava o que surgia de novo, fazendo minha conta lá.
Tinha essa parte de se conectar com amigos da escola, e também de conhecer pessoas novas, de outros lugares. Pessoas que eu não teria conhecido de outra forma, porque a vida e a distância física não permitiriam. E isso foi se perpetuando.
Conforme uma rede social morria, outra surgia, e a gente migrava. Amigos do Orkut foram para o Facebook, depois para o Instagram. Acho que isso acontece porque todo mundo tem, então a gente também tem, sem pensar muito sobre isso.
Você acha que teve então um incentivo social, aquela coisa de “todo mundo tem, eu também preciso ter”?
Sim, com certeza. A gente nem pensa, só vai no fluxo: “Todo mundo tem, eu não vou ficar de fora.” Tem um pouco desse FOMO, medo de ficar de fora, de perder alguma coisa. Todo mundo está ali, então eu também vou.
Quando você usava seu perfil pessoal no Instagram, percebeu alguma mudança no propósito da plataforma?
Sim, com certeza. Acho que todas as redes que consumimos mudaram, como Instagram, Twitter, TikTok. Antes, não existia feed infinito, chegava uma hora que acabava. Hoje, não acaba mais, você pode ficar rolando para sempre, sempre tem algo novo, um estímulo novo, algo que você “precisa” ver.
Teve também a questão da publicidade, que foi se entranhando, e nem sei quando começou, mas de repente você vê um story de um amigo e logo depois aparece um patrocinado. As plataformas são feitas para viciar, para a pessoa ficar o máximo de tempo possível, por causa da publicidade.
Teve algum momento específico em que você percebeu que algo não estava certo na sua relação com o Instagram?
Foram vários pontos. Eu virei mãe e passei a refletir mais. No início, com a euforia de ter um bebê, eu postava algumas coisas, mas consumindo conteúdos de especialistas, comecei a perceber os perigos da exposição de crianças. Então parei de postar coisas dele.
Isso me fez questionar: “Se eu não posto meu filho, o que eu estou postando? Por que estou postando?” Vi que era muito por ego, para mostrar algo bonito que eu estava vendo.
Também percebia que consumia conteúdos de pessoas que não faziam sentido para mim, pessoas que expunham a vida por engajamento. Isso me fazia questionar minha coerência.
Tentei transformar meu perfil em literário, já que publiquei um livro e tenho vontade de seguir carreira literária. Mas percebi que para falar de um livro que levei um ano para ler, eu teria que fazer um vídeo de um minuto, com frases de efeito para prender atenção. Achei isso ridículo e não quis mais participar.
Você tentou reduzir o uso do Instagram antes de sair?
Tentei, coloquei um limite de 15 minutos por dia e em alguns dias nem entrava. Mas percebi que em dias de ansiedade, em vez de buscar algo que me acalmasse, como ler um livro, tomar um banho, eu ficava mais tempo no Instagram.
Era a forma que eu buscava me recompensar por um dia muito corrido ou de muito trabalho, mas isso gerava ainda mais ansiedade.
Você chegou a buscar ajuda ou estratégias para usar a rede social de forma mais consciente?
Eu mesma criei estratégias, mas percebia que meu uso, apesar de não ser tão alto (cerca de uma hora por dia), ainda era demais para o que eu acreditava. Para outras pessoas, isso pode parecer pouco, mas para mim, considerando meus valores, era muito.
O que você diria para alguém que sente um incômodo parecido, especialmente em relação aos filhos e valores, mas não sabe o que fazer?
Eu pensava: “Se eu fosse meu filho, o que eu veria?”
Meu filho não tem acesso a telas, mas me vê pegando o celular, mesmo que seja apenas para checar notificações.
Eu não queria que ele crescesse achando que isso é normal, que o adulto está sempre no celular.
Percebi que não adianta só não dar telas para ele, eu também preciso ser exemplo, eu não quero que ele seja um adolescente dependente de telas. E para isso, eu preciso mostrar agora para ele, que a gente pode ser uma pessoa completa, possuir muitos interesses, gostos e hobbies, e que não envolvem telas, que não envolvem ficar no celular o tempo todo.
Para quem pensa nisso, lembro da frase do Saramago: “É preciso sair da ilha para ver a ilha.”
Quando saí do Instagram, senti um alívio imediato. Não precisava mais mostrar o que eu estava fazendo, dar parabéns nos stories, ou consumir vidas irreais. Vi que a vida comum, mesmo simples, é muito melhor.
Você usa outras plataformas, como o YouTube?
Sim, tenho usado mais o YouTube como podcast, ouvindo no tempo normal, sem aceleração (jeito que falamos na vida real), buscando conteúdos que agregam, como vídeos sobre livros. Percebo que é outro público, mais interessado em aprender.
Eu não pretendo voltar para o Instagram, porque entendi que não existe um uso saudável, em nenhum nível.
8 motivos que abriram meus olhos para sair do Instagram
Durante meu processo de repensar o uso das redes, fui reconhecendo vários pontos que me mostraram com clareza o quanto aquele ambiente já não fazia sentido para mim.
Listei aqui os principais motivos que pesaram na minha decisão de sair do Instagram:
(1) A exposição incessante de crianças em troca de fama e dinheiro. Um dos primeiros pontos que me fez repensar tudo foi ver como as redes normalizaram essa prática, com pais transformando filhos em conteúdo — e a plataforma apoiando isso.
(2) A carência do brasileiro por ídolos vazios. Era frustrante ver perfis que, na minha opinião, não agregavam nada, recebendo atenção cega de pessoas que eu considerava inteligentes.
(3) O crescimento de influencers enriquecendo com a desgraça alheia. Exemplos como jogos de aposta e conteúdo tóxico pipocando sem controle.
(4) A criação de padrões inalcançáveis em tudo: produtividade, beleza, vida. Não só os influencers, mas nós mesmos caímos nisso, mostrando sempre o lado mais bonito e filtrado da vida, o que cria uma falsa conexão.
(5) O efeito da “vida montada para foto”. Sempre fui mais crítica com isso, mas percebi que estava entrando nessa lógica de “story bem montado”, o que foi me afastando da minha própria essência.
(6) A padronização forçada em tudo. Todo mundo usando o mesmo cabelo, roupa, filtros, procedimentos. O bombardeio visual não dava trégua.
(7) O fato dos nossos dados serem tratados como mercadoria. A rede não era mais sobre conexão, era sobre vender, manipular comportamento e alimentar algoritmos.
(8) O incômodo com o poder crescente dos bilionários das Big Techs. Sei que não dá para sair de tudo, mas onde eu posso escolher, como o Instagram eu decidi sair.
Essa foi minha escolha. Não foi para me isolar, mas para estar mais presente na minha vida real.
– Um Depoimento sobre o Programa Origens: Joaquim Piza
Conclusão
Aline deixou um depoimento muito rico, além da narrativa pessoal dela, esses 8 pontos trazem um olhar mais crítico, quase um manifesto. Hoje, ela usa as redes sociais apenas em formato profissional.
O que fica evidente pela fala dela é que a saída não foi impulsiva, mas resultado de um processo de conscientização, onde ela começou a perceber contradições entre seus próprios valores e o ambiente digital onde estava inserida.
A partir da sua curiosidade e questionamento, ela abriu a possibilidade de experimentar a vida de forma diferente, com mais coerência e conectada com seus valores.
Agradecimentos
Agradecemos à Aline pela generosidade em compartilhar sua história e reflexões. Histórias como a dela inspiram mudanças reais e mostram que é possível viver com mais consciência e liberdade.
Com nosso respeito e admiração, obrigado.
Ricardo e Equipe Climb4Life®
